Brasil é reconhecidamente um país desigual. Os dados de concentração de renda e desigualdades educacionais o colocam entre um grupo seleto de países que apresentam baixas condições de mobilidade social e de oportunidades produtivas.
O Índice Gini, indicador que mede a concentração de renda indica o quão restrito é o acesso a renda no Brasil (0.533 em 2017). Essa concentração é resultado de uma baixa distribuição das oportunidades educacionais e produtivas.
Essa realidade tão dramática divide o Brasil entre uns poucos com acesso a muitos recursos e potencialidades. E outra a um grande grupo de pessoas com acesso a poucos recursos e que cotidianamente são desafiados pela manutenção de suas vidas. No meio, uma classe média ainda numericamente tímida, frente ao cenário internacional.
A desigualdade é tamanha que além de diferenciar fortemente ricos e pobres, ainda impacta com a falta de condições dignas, com a ausência de direitos humanos como habitação, alimentação, educação e trabalho de qualidade para uma grande parte dos brasileiros.
Causas e consequências
As causas para essa situação encontram-se na nossa história e na nossa estrutura social. São causa complexas, multivariadas e de difícil definição. No entanto, é possível destacar ao menos quatro.
Primeira causa está relacionada a baixa distribuição de terras no Brasil. Desde o início de sua história o Brasil é marcadamente orientado pelo latifúndio, e o título de propriedade acaba sobressaindo-se sobre o uso e função social da terra.
Outro fator histórico está relacionado ao centralismo político e regional. Trata-se de uma característica que permanece desde a colônia portuguesa. A manutenção do território – vide a divisão da América Espanhola –, a centralidade política no sudeste, a concentração dos recursos públicos pela União e a ausência de um espírito federalista mais maduro também são apontados como fator pelo qual existem tantas diferenças regionais e de como um grupo específicos de empresários e políticos acabam influenciando a política nacional a partir de seus interesses locais.
Economia no Brasil
Além disso, o Brasil apresenta uma economia pouco integrada aos circuitos dos bens manufaturado e dos bens intangíveis. Ao longo do século XX o Brasil conseguiu dar grandes passos na sua industrialização. Uma verdadeira revolução aconteceu entre 1930 e 1980. Nesse período o Brasil alcançou índices de industrialização e crescimento comparável ao fenômeno chinês.
Entretanto, pela ausência de uma institucionalidade democrática e mais desenvolvida, acabamos não dando o passo seguinte da industrialização contemporânea, marcada pelas tecnologias informacionais, pela economia criativa e pelos bens intangíveis. Paralelo a isso, houve contínuo crescimento populacional, o que demandaria mais recursos, desenvolvimento sustentado que pudesse garantir mais disponibilidade econômica e por conseguinte de renda para a maior parte da população.
Atualmente, o Brasil mantém sua balança comercial por meio de produtos agrícolas e minerais. Seu remanescente protagonismo industrial na América Latina segue ameaçado, pois está pouco integrado as cadeias globais de produção de alto nível.
Por fim, o Brasil é marcado por uma concentração oportunidades, fruto de alianças políticos-empresariais e de uma burocracia que acaba limitando a atuação de novos agentes e atores sociais e econômicos. Empreender no Brasil é um desafio tanto por possuir um quadro empresarial protegido quanto pela burocracia.
Consequências da desigualdade
As consequências dessa desigualdade social refletem em todas as áreas da vida brasileira. Seja cultural, social e política. Essa alta concentração de renda e a desigualdade social como um todo implica em uma baixa capacidade educacional e econômica em geral. Acabam formando-se ilhas de privilégios e crescimento, que buscam a todo custo manter suas condições. Isso implica, por conseguinte, em um estado social mais conflituoso e tenso, o que gera baixo capital social e fragilidade institucional.
Nessas circunstâncias, não é difícil que se tenha uma exploração intensa da mão-de-obra, tornando improdutiva a relação capital-trabalho. Como se não bastasse, essa situação de alta desigualdade acaba por intensificar as já existentes desigualdades de gênero e por cor/raça. No Brasil, ser mulher, negra e pobre interseciona ainda mais as limitações para uma vida digna e cidadã, por exemplo. A desigualdade relega alguns ao papel de subcidadões.
Por fim, a democracia e o apego a política ficam ainda mais fragilizados. Para a grande maioria das pessoas a política acaba tornando-se um inimigo público. No entanto, não há vida social e pública sem vida política, e é no âmbito da política, participação e pressão social que se é possível ter mudanças nesse quadro de desigualdades. A política e o poder não aceitam o vácuo e se alguém deixa de participar, outros, seja lá com que intenções, participarão e darão sua tônica nas decisões.
Referências/Para saber mais:
NORTH, Douglass. et al. Limited Access Orders in the developing world: a new approach to the problems of development. Policy Research Working Paper, The World Bank, v. 4359. 2007.
SOUZA, Jessé. A modernização seletiva: uma reinterpretação do dilema brasileiro. Brasília: Editora UNB, 2000.