Fazia tempo que eu não ia ao cinema. Digamos que os filmes do momento não têm me chamado atenção. Além disso, na cidade onde vivo hoje em dia, infelizmente há poucas opções de cinema, então basicamente assisto filmes na minha casa mesmo. Porém, comentários na internet sobre o filme Get Out – título traduzido no Brasil como Corra! – me chamaram a atenção. “Como assim um thriller em que um homem negro é aterrorizado por pessoas brancas? Sobre o que é realmente esse filme? Preciso ver!” Devo dizer que também não sou muito fã de filmes de terror, mas pela primeira vez em muito tempo me animei em ir ao cinema.
Antes de contar minhas impressões sobre o filme, considero importante dizer que não sou crítica de cinema. Uma análise mais técnica e especializada precisará ser buscada em outras fontes. Aqui eu posso oferecer apenas uma opinião de espectadora e interessada em temas abordados no filme, como o racismo. Dito isto, podemos começar com um breve resumo para situar quem não faz ideia de que filme é esse.
O protagonista é Chris (interpretado por Daniel Kaluuya), um jovem negro que namora uma mulher branca, a Rose (interpretada por Allison Williams). Ele é um fotógrafo, independente, aparentemente bem sucedido em sua profissão, que vive sozinho. Ela é mostrada apenas como parte de uma família rica e tradicional, que Chris vai conhecer ao fazer uma viagem em um fim de semana. Rose quer apresentá-lo à sua família e ele, desde o começo, se sente um pouco incomodado com a situação, por não saber como os pais da namorada vão lidar com o fato de ele ser negro. O incômodo não passa ao chegar na casa da família, embora os pais o tratem de maneira muito amável, excessivamente atenciosos. Chris percebe que há algo estranho em todo aquele contexto e, realmente, aos poucos vai se dando conta de que está em um lugar hostil e perigoso para ele.
Não esperem um terror clássico como de filmes do mesmo estilo. Uma música sinistra e um clima estranho são o que vão te lembrar que você está assistindo um filme assim. O verdadeiro terror é outro.
O racismo é o grande terror
Li alguns comentários sobre esse filme antes de ir assisti-lo. Um deles me chamou muita atenção. (Infelizmente não vou me lembrar onde li, porque li muitas coisas, porém não salvei nenhuma. Se alguém souber, coloque a fonte aí nos comentários, por favor.) Esse comentário destaca justamente a falta de “recursos de terror”, que geralmente vemos em filmes desse tipo – como máscaras e sustos, por exemplo – argumentando que um dos maiores medos de uma pessoa negra é ser morta apenas por ser negra. Eu não havia visto o filme ainda, então apenas guardei esse comentário, mas ao assistir concordei bastante: o racismo é o grande elemento de terror nesse filme.
O racismo está presente desde o início do filme. Rose é namorada do Chris, mas é extremamente racista em “pequenas atitudes” que talvez pudessem passar despercebidas, como comentários condescendentes ou que menosprezam os sentimentos do Chris, manipulando a situação de um jeito em que as más impressões e o racismo sentido por ele ficassem parecendo apenas “coisas de sua cabeça”. O racismo aparece também nas falas e atitudes do pai de Rose que tem uma postura do tipo: “não sou racista, eu até votei no Obama”. E fica explícito na atitude do irmão de Rose, que fala sobre a “genética e porte físico” de Chris para ser um grande atleta, se ele quisesse.
Mas a grande questão, que vai aparecendo aos poucos, é a manipulação mental. No filme, é como os brancos conseguem “controlar” os negros e usurpar seus talentos e habilidades. Parece diferente da realidade? Uma das faces do racismo é a manipulação do pensamento, fazendo com que se acredite que os negros merecem passar por tudo o que passam, tirando a autoestima, eliminando a cultura, a religião, apagando a história e substituindo pelo que se chama de “história oficial”, que nada mais é do que a história contada pelos brancos.
Nesse sentido, chamo a atenção para a importância de produções como essa. É uma ficção, um terror entre tantos filmes de terror que existem, mas é um terror mais real do que muita gente imagina. O filme é uma crítica à sociedade racista e acredito que ele deva ser lido dessa forma, embora isso não o desqualifique como uma obra cinematográfica de qualidade. Como falei no início, as questões técnicas eu prefiro deixar com os entendidos, mas definitivamente não é um filme “de segunda categoria”, tanto é assim que já tem sido considerado um grande êxito de bilheterias, considerando o investimento inicial feito para a produção.
Outro ponto interessante é ter um negro como protagonista. Não ridicularizado, não de uma forma cômica. Considero que só esse aspecto já oferece ao filme uma importância sem tamanho. O diretor Jordan Peele consegue romper com os estereótipos e expectativas relacionados à construção de um personagem negro para o cinema e isso é um ponto muito positivo.
A essa altura já deu para vocês perceberem que eu gostei bastante do filme. Não vou negar, gostei mesmo. Achei um filme bom, necessário e importante. Espero que as pessoas que o assistam realmente pensem com mais profundidade na mensagem que ele traz e olhem criticamente para si mesmas.
Se você assistiu esse filme, deixe seus comentários aí sobre o que achou, do que gostou, do que não gostou, quero saber sua opinião. Continue acompanhando o Beco para saber mais sobre os filmes que temos visto.
Esse filme na minha opinião daqui a algum tempo vai ser uma referência. Ainda mesmo assim, ele possui um humor negro que acaba por nos trazer uma sensação estranha. Parabéns pelo post.
Obrigada pela visita e pelo comentario, Igor! Também acho que no futuro esse filme será uma referência. E certamente merecerá esse posto. =)