Até que ponto alguns seres humanos se julgam no direito de tirar a liberdade de outros? E o que este mesmo ser humano é capaz de fazer para ter sua liberdade de volta? Exemplos vergonhosos e também inspiradores da capacidade humana tanto de violar como de lutar pela liberdade estão presentes nessa história incrível contada por Slavomir Rawicz em “Caminho da liberdade” da Editora Record.
Em 1939 o jovem soldado polonês Slavomir Rawicz foi preso pelos russos e após meses sofrendo privações e torturas, foi condenado a 25 anos de trabalhos forçados num campo de concentração na Sibéria. Os tormentos físicos e psicológicos sofridos durante o tempo na prisão, assim como a viagem em condições desumanas num vagão de trem com outros presos e por fim a chocante reta final até o campo de concentração acorrentado e puxado por um caminhão, em plena hostilidade climática da Sibéria foram apenas o prenúncio de todas as dificuldades e sofrimentos inimagináveis que ele e outros estavam para viver.
Ao contrário de outros condenados, Rawicz não aceitava ideia de passar os próximos 25 anos de sua vida como escravo. Depois de um período vivendo no Campo 303 ele recebe uma ajuda improvável e providencial para colocar seus planos de fuga em prática.Com essa ajuda fundamental ele conseguiu juntamente com outros seis prisioneiros, planejar e colocar em prática uma fuga que se transformaria numa inacreditável jornada de milhares de quilômetros da Sibéria até a Índia.
Com histórias e origens distintas, Rawicz, Kolemenos, Makowski,Marchinkovas, Paluchowicz, Zaro, Smith e posteriormente Kristina, cujo caminho milagrosamente se cruza com o deles, vivem a dura e extraordinária experiência de cruzar vários quilômetros de paisagens desconhecidas e inóspitas com poucos recursos, movidos apenas pelo desejo de serem livres de novo.
Durante essa marcha épica e difícil ao encontro da liberdade, eles passam por adversidades climáticas extremas, vivem a luta constante de obrigar um corpo exaurido a seguir em frente. Sentem a felicidade de encontrar água ou comida num momento crucial adiando assim por mais um tempo, a morte iminente. Sofrem a dor de perder um companheiro. Alegram-se com a comovente hospitalidade de pessoas desconhecidas que encontram pelo caminho. Essas e outras experiências dolorosas e marcantes preencheram seus dias sofridos e incertos em meio ao desconhecido.
Depois de muito sofrimento e indo contra todas as probabilidades alguns deles chegam até a Índia onde são resgatados e após algum tempo retomam suas vidas. Mas o preço da liberdade também foi alto para alguns deles que perderam a vida ao escolherem seguir a esperança de serem livres. Valeria a pena ter vida sem ter liberdade? A terrível escolha entre seguir o instinto de se manter vivo ao preço da liberdade ou seguir o instinto de se manter livre a todo custo, foi o dilema prático e filosófico que aqueles homens viveram.
De modo simbólico esse é o mesmo dilema filosófico e muitas vezes prático que vivemos. Essa mesma escolha difícil todos nós temos que fazer.A essa pergunta temos que responder: Afinal vale a pena ter vida sem ter liberdade? Seja num campo de concentração seja na sociedade, o instinto de se conformar para sobreviver por vezes supera o instinto de preservar e lutar pela própria liberdade e direitos e assim de modo geral, o ser humano se submete a abusos e injustiças e abre mão do seu direito fundamental de ter uma vida livre.
Ao final da jornada, tanto a jornada da vida como a jornada narrada nessa história incrível, alguns ficam pelo caminho e não alcançam a desejada liberdade de volta apesar de terem tido a coragem de busca-la. E ao serem movidos por essa busca pela liberdade, de muitas formas essas pessoas já foram livres. Nisso está a grandiosidade dessa história e nisso reside o desafio da vida.