Iniciamos uma série sobre as Escolas Literárias, e o Trovadorismo é a primeira a acontecer em Portugal — e depois no Brasil.
O Trovadorismo é o gênero literário presente entre os séculos XII e XIV, Idade Média feudal.
Como o próprio nome diz, os poetas da época eram chamados de trovadores, ou seja, artistas que compunham e cantavam seus poemas com a ajuda de instrumentos de cordas.
Dessa forma, os poemas eram chamados de cantigas, as quais eram majoritariamente criadas e cantadas por homens. Não duvido que algumas mulheres pudessem cantar também, porém não era algo que elas pudessem compartilhar com o mundo.
Este detalhe é importante: nunca encontraremos cantigas em texto escrito, apenas cantadas!
Assim, o papel das mulheres no Trovadorismo era o de soldadeiras, ou seja, podiam acompanhar de fundo o cantar dos homens.
Entendendo o contexto da época
Naquele tempo, Portugal e Espanha estavam em processo de separação, por isso boa parte das cantigas ainda eram em galego-português, uma mistura entre as línguas dos dois países.
Após a Guerra da Restauração, que oficializa a separação entre os países, inicia-se um período de renovação social em Portugal, e o país começa a se reestruturar. A língua, a cultura, e os costumes vão tomando forma, constituindo Portugal como conhecemos hoje.
Como vimos no post anterior — O que são as escolas literárias —, a literatura de um lugar sempre refletirá os acontecimentos sociais da época em que se vive.
Para entender o contexto desta primeira escola literária, então, é preciso ter em mente que o Trovadorismo constitui-se de temas teocêntricos (Deus como centro de tudo), monárquicos, e feudais (há um vassalo, um servo, que é totalmente dependente de seu senhor feudal).
A literatura no Trovadorismo
A literatura trovadoresca pode ser dividida em prosa, relatos de histórias, ou em poesia, no formato das cantigas.
A prosa é dividida em quatro estilos:
- crônicas: escritas em latim, contava histórias sobre Portugal e sua formação;
- linhagem: relatos sobre as famílias importantes do país – sua linhagem;
- hagiografia: enredos que envolviam as histórias dos santos;
- novelas de cavalaria: relatos de cavaleiros – como a do Rei Artur.
A poesia, por outro lado —maior expressão do Trovadorismo — divide-se em duas: cantigas líricas e satíricas.
- Cantigas líricas — mais amorosas, com destinatárias mulheres:
- cantiga de amor: eram destinadas à mulher amada, pertencente à nobreza; desta forma, uma mulher inalcançável. As cantigas não podiam revelar o nome da destinatária, tornando as letras ainda mais tristes.
Como vimos, o Trovadorismo acontece em um momento em que Deus é central na sociedade. Por este motivo, a mulher amada das cantigas quase assemelha-se à Virgem Maria, de tão pura, casta, e bela.
Veja um exemplo:
No mundo ninguém se assemelha a mim
Enquanto a vida continuar como vai,
Porque morro por vós e – ai! –
Minha senhora alva e de pele rosadas
- Cantiga de amigo: da mesma forma como na cantiga de amor, a de amigo também revela um amor impossível. No entanto, o eu lírico (a voz) do poema é uma mulher. Não é escrito por mulheres, é como se fosse, apenas.
Se sabedes novas do meu amado
aquel que mentiu do que mi ha jurado!
Ai Deus, e u é?
2. Cantigas satíricas — feitas para caçoar de uma pessoa ou grupo. Podemos ver aqui críticas à sociedade:
- cantiga de escárnio: tem o objetivo de tirar sarro de alguém. É um estilo mais discreto, o qual não revela o nome do destinatário.
E vedes como vos quero loar:
Dona fea, velha e sandia!
Dona fea! Se Deus me pardon!
- Cantiga de maldizer: também tem intenção de zombar de uma pessoa, porém de uma forma mais grosseira e direta, citando seu nome:
Maria Pérez se maenfestou
noutro dia, ca por [mui] pecador
se sentiu, e log’a Nostro Senhor
pormeteu, polo mal em que andou,
que tevess’um clérig’a seu poder,
polos pecados que lhi faz fazer
o Demo, com que x’ela sempr’andou.
O vídeo abaixo traz uma cantiga de amigo como exemplo, do Rei Dom Dinis, um dos Trovadores mais importantes da época: