Home>Principal>você é minha mãe?

você é minha mãe?

vc-e-minha-mae1Uma das leituras mais agradáveis para mim são quadrinhos biográficos. Escritos de maneira despretensiosa, me parece que acabam sendo mais honestos que as biografias escritas da forma tradicional. Posso estar errada, mas a impressão que tenho é que a pessoa consegue falar muito mais sobre os sentimentos do que viveu quando pode usar as palavras do Dia a dia.

Foi por isso que me interessei em Você é Minha Mãe? (Alisson Bechdel, Quadrinhos na Companhia). A intenção de Alisson era escrever sobre a vida de sua mãe, mas acabou falando sobre outras coisas, coisas mais profundas e que norteiam a vida de Alisson. É mais um despertar da autora para sua própria vida, tirando um pouco da culpa das costas de sua mãe.

Com referências constantes a Virginia Woolf, a autora abre sua história comparando como é escrever um livro em que precisa expurgar os problemas que tem com a mãe em uma obra. Usa como exemplo Woolf, que escreveu com essa intenção Ao Farol (diversas editoras) e conseguiu finalmente acabar com os problemas e tristezas que tinha com sua mãe. Em diversos momentos Alisson cita partes do diário de Woolf ou Ao Farol.

Outro autor que foi constantemente citado e parafraseado é psicanalista Donald Winnicott. Referência no estudo de psicanálise infantil, Winnicott escreveu diversos livros sobre a influência materna na formação da criança em adulto. As obras de Winnicott foram importantes para a autora entender a relação entre ela e a mãe Ao compreender a base de seus problemas na infância, a autora conseguiu ver claramente parte dos problemas que a norteiam quando o assunto é a família.

O título menciona a mãe, mas a história não tem como foco falar sobre como foi a mãe de Alisson. Apesar de fazer isso em algumas partes, o ponto alto do livro é o desenvolvimento da autora entender sua própria vida e a importância da sua mãe nas decisões que ela tomou até hoje.

Se a principio acreditamos que Alisson tem problemas sérios com a mãe, no decorrer da obra descobrimos que, ao mesmo tempo que as duas brigam, elas são muito próximas. Minha percepção é que a duas precisam uma da outra, de ter suas opiniões e aprovações. Acredito que a própria Alisson descobriu isso quando terminou o livro.

A obra começa com uma autora perdida, querendo escrever algo para a mãe, mas não sabe ao certo como fazer isso. Aos poucos percebemos como ela é frágil, ela tem medo de escrever algo e magoar a mãe. O modo como ela desenha percebemos o cuidado e perfeccionismo de Alisson, ela mostra uma delicadeza e, ao mesmo tempo, destreza nas linhas. E no texto sentimos uma pessoa honesta. Ela se abre completamente ao escrever, descrevendo não só o que percebeu, mas o que sentiu naqueles momentos.

A HQ é linda. Achei interessantíssimo as partes sobre Virginia Woolf e Winnicott, as citações são um “abrir de olhos” para entendermos melhor a vida de Alisson e até mesmo a minha. À medida que lia, lembrava-me de momentos parecido que passei com minha mãe, acredito que qualquer leitor irá se identificar com Alisson em alguma parte de sua história.

 

Luciana
Jornalista e editora, mestre em rádio e televisão.

Deixe uma resposta