Quando Henry James escreveu Pelos Olhos de Maisie (Penguin-Companhia) o termo “ALIENAÇÃO PARENTAL” não era conhecida. Apesar do termo ser bem recente, a situação, onde pais usam os filhos para se vingar ou os colocam em meio a uma “guerra” sempre existiu.
Pelos Olhos de Maisie temos a visão de uma menina sobre o turbulento relacionamento entre seus pais, um casal que divide a guarda da criança após o divórcio. A vida de Maisie se divide entre a casa dos pais, ela vive seis meses com cada um, onde ela passa a ouvir todo o tipo de reclamação e injurias entre os pais. Enquanto está com a mãe, chove comentários maldosos sobre o pai, e vice versa.
Ao mesmo tempo em que a criança é jogada entre as trincheiras de um campo de batalha, a menina se vê rodeada por pessoas que a amam incondicionalmente. Enquanto seus pais não demonstram amor e carinho incondicional, Maisie conquista o amor e carinho dos criados, do padrasto e da madrasta.
Quando comecei a ler o livro, terminei o primeiro capitulo chocada. Não esperava que me deparar com uma guerra tão baixa como a declarada pelos pais de Maisie, muito menos que a principal arma usada seria a menina. O que piora a situação é o fato que a “arma utilizada”, é algo descartável, parece que amor é algo ignorado ou desconhecido pelos pais dessa menina.
À medida que os capítulos avançavam ficava mais impressionada. Henry James soube usar o clichê a seu favor, pois quando acreditava que a trama iria seguir por um rumo ele usava esse rumo e o distorcia de tal forma que assustava. Há muito tempo que não lia um livro em que não fazia ideia do que aconteceria na página seguinte.
Sobre o autor, só posso chama-lo de gênio. A história me impressionou de diversas maneiras. Primeiro por usar um tema que, na época, não era discutido ou conhecido (primeiro ponto para James, pelo pioneirismo), falar sobre relações familiares turbulentas na qual o foco está na criança e não nos adultos em uma época em que divórcio era raridade é algo difícil de se encontrar.
Segundo é ter como personagem principal a criança. O que ele estava pensando quando teve essa grande ideia? E apesar de não ser pai, soube escrever sobre sentimentos e preocupações como se realmente fosse uma criança da idade de Maisie. Claro, Maisie não era uma criança qualquer, e muito menos ingênua ou burra, mas ainda assim a colocou como uma criança que se sente como uma criança. As percepções sobre seu conhecimento e discernimento (o auge do livro é quando percebemos que a criança já tem discernimento bem apurado) se dão aos poucos, à medida que Maisie cresce. Algo bem fácil de acontecer é o autor errar na dose e alienar a personagem, ato que James não o fez.
O terceiro ponto é a narrativa. Com um texto muito bem trabalhado, sem espaço para frescuras ou palavras difíceis, mas repleto de frases belas e muito bem inseridas no contexto. Até mesmo a forma como Henry James nos choca com situações inacreditáveis me impressionou. O autor soube usar toda a criatividade e conhecimento de palavras, me deixando perplexa com um texto que flui de forma delicada e assustadoramente cativante.
Eu me apaixonei por essa criancinha chamada Maisie. Entendi suas tristezas e saudosismo. Toda vez que ela andava pelas ruas de Londres, sentia um aperto no coração, às vezes achava que era saudades de um lugar tão mágico para mim, mas aos poucos percebi que as entrelinhas, Henry James queria que sentíssemos as saudades que Maisie tinha daqueles momentos, dos passeios por ruas de Londres em sua infância. Quando percebi isso percebi que Pelos Olhos de Maisie não é só um livro, mas uma obra prima da literatura.
O livro ganhou uma nova versão cinematográfica. Não chega aos pés da obra, mas dá um gostinho do que se fala sobre o livro. Lembrando que há muitas diferenças nessa versão e o final não é o mesmo.