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O livro das ignorãças

Confesso que não tenho costume de ler poesia. Conheço um pouco das obras de Carlos Drummond, Florbela Espanca, Fernando Pessoa e outros bem conhecidos. Estudei no curso de Letras sobre o gênero lírico de Camões e me encantei. Impossível não gostar ou não valorizar seus poemas rebuscados e suas rimas bem formadas. Quem não sabe citar seus versos mais conhecidos, “Amor é fogo que arde sem se ver, é ferida que dói, e não se sente”?

Mas, o que Camões tem a ver com Manoel de Barros? Nada, realmente, a não ser o fato de que, em meu ponto de vista, são os dois opostos mais brilhantes da poesia. O primeiro, por produzir versos com métrica rigorosa, atentando-se aos decassílabos e redondilhas e, o segundo, por não seguir, como o poeta português fez, regra alguma.

Acredito ser pertinente dizer que Manoel de Barros quebra qualquer tipo de regra em seus textos e não se encaixa em nenhum estilo literário. O poeta escreve com uma liberdade que ele mesmo afirma em O livro das ignorãças: “Poesia é voar fora da asa”.

Eu louvo sua simplicidade e imensa criatividade em confundir as palavras. Sim, confundir, misturar, extrair sentido, deixá-las nuas e singelas. Nos poemas do autor, a palavra está por ela mesma.

É quase um equívoco tentar explicar as qualidades e habilidades poéticas de Manoel de Barros. Apenas lendo é possível entendê-lo. É por este motivo que eu indico O livro das ignorãças, para que nossos leitores o conheçam e se encantem com uma língua portuguesa distorcida.

A seguir, deixo o poema XXI do livro:

Ocupo muito de mim com o meu desconhecer.

Sou um sujeito letrado em dicionários.

Não tenho que 100 palavras.

Pelo menos uma vez por dia me vou no Morais ou no Viterbo –

A fim de consertar a minha ignorãça,

mas só acrescenta.

Despesas para minha erudição tiro nos almanaques:

– Ser ou não ser, eis a questão.

Ou na porta dos cemitérios:

– Lembra que és pó e que ao pó tu voltarás.

Ou no verso das folhinhas:

– Conhece-te a ti mesmo.

Ou na boca do povinho:

– Coisa que não acaba no mundo é gente besta e pau seco.

Etc

Etc

Etc

Maior que o infinito é a encomenda.

Liv
Mestranda em Literatura e Crítica Literária. Me considero uma pessoa multipotencial, com gostos e interesses diversos. Mudo de trabalho, troco de bairro e deixo amigos de lado, mas livros e literatura nunca saem da minha vida.

19 thoughts on “O livro das ignorãças

  1. pronto, agora estou inspirada a ler poemas.

    Amei esse poema que vc citou do Manoel de Barros. Não entendo patavina de poesias, nem as classes litarárias, só sei ler, admirar, deixa o coração mais leve, sabe?

    amei a resenha!
    bj

  2. Adorei! Também gosto, mas leio poucos livros de poesia.

    Literatura Portuguesa foi uma das que mais gostei de estudar no curso de Letras.

  3. nossa adoreii viu muito bom gosto, ultimamente estou sem tempo pra leitura mais adoro poesias ^^
    e adorei a sua visita no meu blog viu brigado mesmo

  4. Então, tbm nunca fui fã de poesia, mas procuro sempre ler algo desse gênero, sendo de gente conhecida ou não… isso me abre horizontes para uma escrita diferenciada, que é sempre o que procuro oferecer em meu blog…

  5. adoro poesia.
    mas puxo mais pro lado de Vinícius de Moraes e Shakespeare.
    Apesar de ter gostado muito dos textos de Camões que li.
    (Dos quais não me lembro o nome no momento -.-) há
    enfim, gostei dos argumentos, da citação.
    não conhecia esse MAnoel de Barros.
    mas gostei da poesia que colocou no final! 🙂 ha,
    quanto tiver tempo pesquiso outras, pra ter uma opinião formada sobre ele 😀

    abç, muito bom seu blog :*

  6. Opa, descobri blogueira que fala do que eu gosto: literatura! E das boas!

    Não vi nome de poeta pobrezinho (em palavras) aqui não, mesmo vc tendo começado o post dizendo que não curtia tanto assim poesia.

    Falar sobre Manoel de Barros é difícil mesmo. O cara descostura a palavra e começa a tecê-la de novo. É realmente fantástico.
    Ah, saiba que criaram um twitter fictício pra ele, e é bom pacas. Fica a dica. 😉

    Adorei o espaço. Vou te linkar lá no blog.

    Beijones, Letrada!

    p.s.: Sou da área também, formada em Letras! 😉

  7. Nossaaaaaaaaaaaaaaa ameiii teu texto e o poema citado.
    Já coloquei seu link do blog, relacionado no meu. Veja na parte do “leia também” do meu blog.

    Depois então coloca o meu link no seu blog, ok?

    Vanda Ferreira:

  8. Livia
    Primeiramente, gostaria de te parabenizar pelo blog, que é de alto nível…muito interessante por seu conteúdo.
    Também quero manifestar a minha opinião acerca do poema, que julgo ser muito útil, como as demais manifestações artísticas, por enriquecer a vida das pessoas…para mim a poesia corresponde a uma espécie de “transe”, um estado de espírito que leva ao poema escrito. Pode tanto representar a realidade do indivíduo quanto contribuir para o escapismo da mesma, o que é para mim muito perfeito.
    Gosto muito de Mário Quintana e de Pablo Neruda, este último busquei conhecer após assistir ao filme “O Carteiro e o Poeta”. Já quanto a Manuel de Barros, só posso dizer-te que não o conheço.
    Como me considero cinéfilo, não resisti e acabei por ler a tua postagem anterior a respeito do filme “O Fabuloso Destino de Amélie Poulain”…o qual considero um filme muito bom…inteligente como poucos; só tenho problemas para ler posts de filmes que ainda não assisti, pois sou “psicopata” a ponto de gostar de ir ver um filme sabendo o mínimo possível do que irá acontecer, hehehe.
    Então era isso…abraço!

  9. Oi Livia!
    Diferente de mim, você escreve de forma incrívelmente concisa e dedilha muito bem as palavras.

    Sublime.

    Também não sou muito de ler poesias, mas adorei e aguardo mais resenhas. =)

  10. Brigada pelo comentário.
    aliás, adooooorei a foto lá em cima, viu :O
    adoro esses angulos, esse tipo de imagem formada por coisas simples, que ficam tão bacanas nas mãos de um bom fotógrafo e uma boa análise de ângulo e enquadramento.
    foi você quem tirou? :~

  11. Nossa, muito bom seu post, bem interessante. É gostoso ler um post de alguém que saiba escrever, é prazeroso, ainda mais quando o conteúdo é interessante como o seu, também sou um amante das artes.. Parabéns pelo blog, muito bom, quero segui-la, mas não vi onde há seguidores aqui… Coloque o espaço para nós fas, segui-la.

  12. Assisti ao filme e ele tá na minha lista de favoritos, mas isso não me incentivou a ler o livro. Não sei… Acho que a leitura não me agradaria.

  13. Bom, eu já gosto muito de poesia e prosa. A rima tem de ser encantadora. Poucas vezes me atrai por versos livres. Não gosto de ficção, e isto inclui o Crepúsculo. Mas gostei das resenhas que você. As 3 que li estão excelentes. Espero que eu possa ler O livro das ignorãças em breve.

    Bjks, sucesso e fik com Deus
    TJ do loucosporvirtude

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