Mil Dias em Veneza

O interesse em ler Mil Dias em Veneza de Marlene de Blasi (ed Sextante, 240 pág) veio dos clientes. Sempre tem uma mulher por volta dos 30 anos que o ler e a maioria diz gostar muito dos livros dela. Quando o Desafio Literário propôs que o mês de janeiro seria literatura gastronômica, não hesitei em escolher um dos livros dela. mas, infelizmente, me decepcionei.

Para começar, a história (que é biográfico) não cola. Não que não acredite que ela se apaixonou por um cara e poucas semanas depois estava ela vendendo casa, empresa e deixando dois filhos para trás por causa de um homem. Nisso acredito piamente e acho até romântico. Mas o modo que ela conta é como se tudo fosse frívolo, sem muita importância, ou seja, como se fosse algo bem natural e insignificante. Desde o início da história ela se descreve como alguém que lutou para conquistar seu espaço, mas no livro inteiro ela se mostra subserviente ao marido, apesar das idiotices que ele fala e que ela mesma afirma que estava irada com isso. Mas em nenhum momento do livro aparece uma briga homérica em que ela desabafa com ele, o que me faz notar que em nenhum momento ela tem aquele desabafo dos problemas que ela sente em nunca conseguir agradar os venezianos nem a ele. Todo mundo tem momentos em que não aguenta e, no mínimo, dá um chilique para no final das conta se resolver. Mas a Marlene não, ela não dá chilique e deixa o marido fazer tudo o que ele quer, mesmo ela não concordando. Me perdoe, mas relacionamentos não são simples assim, o que deixa com a sensação que muita coisa não foi escrita.

O segundo ponto foram os filhos. Eles são mencionados no livro duas vezes. Sim leitores, DUAS vezes em um livro que relata mais de 3 anos da vida dela. A reação deles ao casamento inesperado é breve e não fala muito do que eles acharam. Quando o filho vai visita-la ela comenta brevemente que foi ótimo, e acaba por aí. Eles nem no casamento vão e ela nem se dá ao trabalho de esclarecer, só dá uma sugestão que eles estão trabalhando. Mas como uma trabalhadora viciada, sei que em toda empresa existem folgas, férias e aquela conversa com o chefe, explicando a situação, e não há chefe durão o suficiente que não se derreta a ponto de liberar o funcionário para o casamento da própria mãe que se mudou pra Veneza.

Com isso já fica bem claro que os filhos não aceitavam o casamento da mãe e por isso não iriam, mas ficou mais óbvio ainda que tanto os filhos não permitiram que ela escreve sobre eles no livro e muito menos o marido não aceitou que as brigas feias fossem inseridas. O resultado foi uma história muito fraca que beira a conto de fadas repleto de frases clichés e mal-escrito.

O marido de Marlene é um veneziano que passou a vida inteira trabalhando no mesmo emprego e morando em um apartamento velho do qual  nunca se deu ao trabalho de limpar. Ele afirma que começou a viver após conhecê-la e agora pode finalmente viver. O viver para ele é chorar pela morte do pai (que morreu há anos) e mudar sua vida, sua casa, tudo. Em resumo, ele é um “bundão” (acho nunca usei essa palavra em nenhuma resenha, mas só essa consegue expressar minha percepção). Já Marlene se auto-intitula Poliana, mas na minha opinião é só nos sonhos dela. A Poliana (grande personagem da literatura infanto-juvenil) jamais seria tão resignada e encontraria uma forma muito sutil de transformar o marido em um príncipe corajoso. Como ela não  fez isso (ou pelo menos preferiu se mostrar no livro como uma esposa submissa), nem de longe se parece com a menina que transforma a vida de várias pessoas em seus livros.

E por último, preciso falar da gastronomia (talvez a maior decepção de todo o livro, ainda não consegui decidir): ela quase não aparece. Em poucas ocasiões do livro ela faz um jantar ou fala sobre comida no livro. A mulher é chefe e e só o que faz mesmo é se gabar da comida que faz (e que o faz pouco). O ápice do absurdo está na parte em que ela faz um jantar para o marido e ele fala que ela não precisa cozinha daquele jeito, que em Veneza eles possuem comida enlatada. Qualquer chef de cozinha na hora daria uma bela resposta para um ser humano esdrúxulo como esse (alguns fariam as panelas voarem, outros nem tanto) mas ela não faz NADA. Prova de que ela esconde o ouro mesmo.

Desculpe Marlene, mas como escritora você é uma ótima esposa (porque nem como chef posso dar certeza de que é).

Luciana
Jornalista e editora, mestre em rádio e televisão.

4 thoughts on “Mil Dias em Veneza

  1. Boa noite,

    Gostei muito de sua página!
    Quero te elogiar pela personalidade que tem ao expressar sua opinião.
    Ficaria honrado se visitasse nossa pagina no Facebook, estamos começando agora, e acho que podemos aprender com a sua opinião.

    Grato

    Jônatas

  2. kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
    acho q nunca te li tanto indignada com um livro rsrsr
    Agradeço pela resenha porque vira menos um para comprar hehehe

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